José Saramago
Gostaria, sinceramente, de ter as palavras mais bonitas, a forma mais literária e a linguagem mais poética para escrever uma justa homenagem a José Saramago. No entanto, as lágrimas me cegam. Choro não pela morte do escritor, que permanecerá vivo em cada página por ele escrita, mas sim pela perda de um referencial que aprendi a ver e ter ali tão concreto, tão tangível, tão encarnado... tão aqui. Ao seguir além, Saramago foi definitivamente ocupar um assento que já era seu, ao lado de todos os utopistas os quais, com palavras e ações, definiram meu caráter, minha luta, minha militância. No entanto, essa ausência do ser vivente, do homem de carne e osso que interpretava e questionava cada nova insanidade da nossa vida cotidiana, deixa em mim um grande vazio. Sou a criança que acorda no meio da noite e se descobre sozinha em casa.
Nas suas últimas críticas à efêmera forma de comunicação dos nossos dias, Saramago deu um sentido ainda mais maravilhoso para a minha vida. Se em algum momento, por algum ínfimo motivo, numa fração mínima de tempo, eu cogitei a possibilidade de que um dia eu poderia me arrepender de ter escolhido a área de Letras, ou mesmo se duvidei da importância ou da utilidade daquilo que estudo, certamente isso foi antes de vê-lo dizer o seguinte:
“Se o leitor, o leitor de livros, aquele que gosta de ler, não se limitar àquilo que se faz agora, se ele andar para trás, se ele começar do princípio, se ele pode ler os primitivos, e os grandes cronistas, e depois os grandes poetas, a língua passa a ser mais do que um mero instrumento de comunicação. Transforma-se numa, digamos, mina inesgotável de beleza e de valor.”
Obrigado, mestre.
Márcio Hilário
(18/06/2010)
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