Uma típica cena suburbana desenhada por Jano.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Barrados no baile

“Quando nascemos fomos programados

A receber que vocês nos empurraram

Com os enlatados U.S.A. de 9 às 6.”

(“Geração Coca-Cola”, Legião Urbana)


Fato: a televisão ocupa um espaço excessivo na vida do brasileiro. Para muitas pessoas ela é o único meio de informação, educação, lazer e entretenimento. Inspirada no modo americano de produção de bens culturais, o objetivo inicial e final da TV brasileira é cada vez mais descaradamente o consumo. Roupas, objetos, expressões, gestos, linguagens, enfim, tudo o que possa ser veiculado pelas imagens, que, no fim, para muitos, é a única coisa a qual se tem acesso de verdade. O padrão é o das elites: para ser mais exato, das elites da região Sudeste... ou melhor, do Rio de Janeiro... mas da cidade do Rio... no caso, da Zona Sul... especificamente, do Leblon. Ou seja, nem de muito longe isso representa o modo de vida de 200 milhões de brasileiros. E ainda inventaram a Barra! Ou melhor, a maquete tupiniquim da Nova Iorque carioca. Medo!

Como nossos desgovernos não são nada interessados em investir de verdade em outras formas de manifestação cultural que possibilitem crescimento cognitivo e intelectual às massas, a televisão tem vida muito longa pela frente. Ao espectador, consumidor de imagem, resta sentar diante da telinha e, quando muito, manifestar alguma insatisfação trocando de canal para ver mais do mesmo. Os programas se repetem, as novelas se repetem, as notícias se repetem, os jogos se repetem, tudo se repete para a contemplação passiva dos olhos alienados estampados em caras de novidade. As elites determinam quando a moda vem ou vai e o subúrbio faz da pirataria sua forma de usar o mesmo que os artistas.

Com os canais por assinatura, a coisa ficou ainda mais complexa nos grandes centros. Agora são dezenas de canais a repetirem o mais do mesmo com cara de novidade. Tudo se sucede numa velocidade espantosa. É difícil acompanhar. Principalmente quando não se tem tempo. E o pior é que, sendo professor, acabo passando vergonha! Fui dizer, por exemplo, em uma turma que eu estava achando muito engraçado um enlatado americano que eu, por acaso, começara a acompanhar... pronto! Todos os alunos começaram a rir dizendo que já tinham até parado de gravar a série há uns dez anos. Fiquei realmente com cara de bobo e me senti como um velhote fã de Jovem Guarda.

Depois caiu a ficha: eu estava somente uns dez anos atrasado para uma coisa que a televisão vai acabar reinventando de novo. E os meus jovens televisivos? Será que eles teriam não só tempo, mas, sobretudo, instrumental para uma boa leitura? Quando percebi que a maioria deles nem sequer saberia escolher numa livraria uma boa obra do nosso riquíssimo acervo cultural literário brasileiro e que possivelmente lhes faltariam ferramentas para fazer uma leitura crítica dessas obras, acabei me dando conta de que o meu atraso era bem pequeno.

Márcio Hilário.

24-08-2011




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