Uma típica cena suburbana desenhada por Jano.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

O lobo de Gúbio


Na primeira semana de outubro comemoramos o dia dos animais. Segundo a circense pedagogia moderna, é o período ideal para a realização e correção das provas bimestrais. Já em escolas tradicionais e religiosas, como aquela em que estudei na infância, era o dia de levarmos os nossos bichinhos de estimação – cães, gatos, tartarugas, hamisters e irmãos caçulas – para serem devidamente expostos, apertados e abençoados. Era o dia de São Francisco de Assis.

A escola da minha infância era batizada com o nome do santo e em suas paredes, portas, grades e portões predominava o marrom, assim como em nossos uniformes, inspirados nas roupas dos frades menores. Entretanto, apesar disso tudo, foi o lugar onde eu menos aprendi sobre aquele jovem maluco de Assis. Ora, o fato é que nunca gostei e ainda não gosto dessa caracterização de Francisco como uma espécie de Ace Ventura medieval: o homem que falava com os animais. Ohhhh!!! Que fofo!!!

Lembremos, por exemplo, daquele célebre episódio do ferocíssimo lobo que assolava a cidade de Gúbio, atacando pessoas e outros animais, e que foi amansado por Francisco, que, em seguida, passeou com ele pela cidade e estabeleceu a paz entre seus moradores e a fera. O evento faz a gente pensar: se São Jorge tivesse a lábia de São Francisco, o dragão não tinha virado picolé! Sorte que as ONGs protetoras de animais ainda não existiam!

Entendamos melhor a simbologia que a escola não me ensinou: Francisco tinha uma atitude de defesa dos mais fracos, dos miseráveis, e isso valia para toda criatura. O lobo matava as galinhas e outros pequenos animais para saciar a fome. Em resposta, os homens se armaram para matar o lobo, que, por sua vez, passou a atacar mais e mais homens. E o que fez o pobrezinho de Assis para acabar com esse ciclo de violência e morte? Chamou o BOPE? Não. Criou um novo paradigma na relação entre o lobo e as pessoas de Gúbio: elas o alimentariam todos os dias e ele lhes retribuiria com o afeto recíproco.

A mensagem de Francisco é perfeitamente viva em nossos dias. Precisamos aprender que não se combate injustiça social com violência, mas com uma ação efetiva de amor e compaixão. Precisamos olhar para as crianças e jovens que estão pelas ruas e enxergar menos o monstro e mais a criatura que, com nós, merece uma vida plena. Precisamos aprender que amansar o lobo não é aliená-lo, resigná-lo ou silenciá-lo, mas sim garantir-lhe dignidade. Precisamos, enfim, aprender a aprender a amar, como o fez o garoto de Assis.

Márcio Hilário

05/10/2011



Um comentário:

  1. Ótimo post.
    Realmente falta isso em nós hoje em dia . Precisamos ser mais como São Francisco . Temos que ver o que há por dentro das pessoas.As crianças e os jovens que estão pelas ruas largados tem tanto direito à vida quanto qualquer outra pessoa.Só precisamos enxergar a pessoa em sua plenitude e não enxergá-la por partes e fazê-la aceitar que aquela é a sua realidade. Essa realidade ruim pode ser mudada , basta vermos o ser humano e não o bicho que vemos .

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