Uma típica cena suburbana desenhada por Jano.

terça-feira, 31 de agosto de 2010

A cigarra e a formiga



"A gente não quer só comida

a gente quer comida, diversão e arte".

(“Comida”, Arnaldo Antunes)


Quem não se lembra dessa fábula? Enquanto as formiguinhas pensavam no futuro e trabalhavam, estocando comida para o inverno, a cigarra vivia a tocar e a cantar... toda irresponsável e inconsequente!!! Resultado: quando o inverno chegou, as formigas estavam aquecidas e fartas, ao passo que a cigarra morria de frio e de fome. Moral da história: primeiro vem a obrigação, depois a diversão!


Mas, onde está a verdadeira moral por trás dessa história na infantil?


A supervalorização do mundo do trabalho e da ideologia burguesa é o grande fator moralizante da trama, já que, para essa lógica sistêmica, importa acumular bens no presente, para poder desfrutá-los no futuro (será?). Dentro dessa perspectiva, ao indivíduo só resta a adequação ou a morte. Além disso, a arte está diretamente associada ao entretenimento, à diversão, o que, para essa leitura conservadora, significa perda de tempo. Sendo assim, ela vira elemento secundário, fruto da irresponsabilidade de quem não pensa no futuro e "vaga pela vida sem destino" (ou seja, um "vagabundo"!!!).


O pior disso tudo é que essa visão estereotipada papel da arte na sociedade não é uma exclusividade das formiguinhas: ela vai do aluno que diz que isso não cai não reprova ou não cai no vestibular, aos tecnocratas que não vêem objetivo prático ou valor ($) para algo tão imaterial.


Arte não é mercadoria, mas uma forma singular de ver o mundo, criando outros mundos.



Márcio Hilário.

(31-08-2010)

Um comentário:

  1. Ótimo texto!
    Hoje em dia, na faculdade, vejo como foi importante tudo aquilo que "não caia no vestibular", que "não vai me servir pra nada".
    Essas coisas "inúteis" diminuem nossa alienação pelo mercado de trabalho feroz.
    Obrigada por me ensinar a amar o conhecimento, a cultura, a arte!

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