Sempre que vejo
o anúncio de mais uma reportagem "Global" mostrando o que muda e o
que não muda na relação dos patrões com as empregadas domésticas a partir da
nova legislação trabalhista aprovada pelo congresso nacional, chego à mais pura
e simples conclusão: estamos diante da reação nervosa de uma casta de valores
escravocratas. Toda essa insistência para explicar tuuuuddddooo o que mudou
nada mais é do que um profundo desejo de que naaaaaddddaaaa mude. Usando a
lógica do cansaço, deseja-se que a lei morra prematura. Afinal, quantas não
foram as leis que “não pegaram” no Brasil? A Lei Áurea é seria um bom e
oportuno exemplo, né?
As elites sempre
estabeleceram com suas serviçais da "casa grande" uma pseudorelação
de familiaridade, a qual só serviu para domesticá-las e impedir-lhes que
lutassem por um mínimo de dignidade no seu local de trabalho. Humilhadas pelas
patroas, estupradas pelos patrões, as escravas do lar aguentaram caladas todas
as humilhações. Não foram raras as que nasceram e morreram achando que tudo
isso era natural. Ontem, sobravam os troncos, ferros e açoites; hoje, faltam
condições dignas para exercer sua atividade, faltam direitos elementares para o
trabalhador e para a pessoa humana e faltam remunerações justas e adequadas.
A classe média,
por sua vez, engrossa o coro dos descontentes. Claro! Como que uma pessoa que
trabalha para mim pode requerer os mesmos direitos que eu cobro do meu patrão?
Que petulância! Quer dizer que somos iguais agora? Pois é: soco no estômago! Essa
pequeno-burguesia ainda ontem batia no peito dizendo que era um horror chamar a
Creusa de empregada: aqui em casa ela é nossa secretária. Dois dias depois, a
patroa sente a punhalada nas costas e, enquanto a autora do golpe fatal limpa o
sangue da carteira de trabalho, a moribunda ainda tem tempo de olhar a
assassina nos olhos e dizer: “Até tu, Creusa?!”.
Fico pensando em
como Monteiro Lobato receberia a notícia da mudança dessa relação de trabalho. Será
que ele aceitaria que aquela negra ignorante se virasse para a Dona Benta e
pedisse a sua parte da grana da vendo do livro de receitas? Pois é, porque eu
não me lembro de ter lido nada sobre aquela velha fritando um ovo sequer.
Diga-se de passagem, ela sempre foi a maior historinha. A pobre da Tia Nastácia
é que ficava com o umbigo o dia todo no fogão e sendo perturbada por aqueles
viciados em pó de pirilimpimpim. Dona Benta, por sua vez, como uma grande
matriarca das famílias brasileiras, proclamava em alto e bom tom o princípio
igualitário nacional: “Não quero que trate Nastácia desse modo. Todos aqui
sabem que ela é preta só por fora!”.
Márcio Hilário
11-04-2013
Excelente colocação mestre, infelizmente -depois do paradeiro do casal Bruna Marquezine e Neymar- o assunto com mais repercussão nos meios de comunicação é os novos direitos da empregada doméstica. Repercussões essas, ainda que indiretamente, sofrem fortes indagações críticas da sociedade "melhor sucedida", ratificando a visão preconceituosa dessas classes com às de "menor expressão" caracterizando a famosa e conhecida desigualdade social.
ResponderExcluir